segunda-feira, 22 de julho de 2013

To Be or Not To Be - Eis a Questão


Ser ou não ser tinha tudo pra titular este texto, caracterizando o existencialismo do escritor e até porque recentemente vi o muito bom filme "Anônimo" que fala de Shakespeare, mas a referência a Poeta/Não Poeta prevaleceu, talvez com alguma perda. Tudo bem, não se pode ganhar todas. Pelo menos, ainda que sem muito querer, voltei a dizer alguma coisa.


Escrever/Não Escrever

Depois do Poeta/Não Poeta, pequeno texto em que me referi a Castro Alves e ao fato de que poderia não mais escrever, é a primeira vez que “faço uso da pena” como diria meu conterrâneo José de Alencar. E o que me levou a molhar o bico, ou melhor, a tirar um pouco da poeira do teclado? Foi exatamente a não vontade de escrever e que me fez lembrar de um outro grande nome da literatura nacional, Carlos Drummond. Há bastante tempo li em um jornal, onde ele escrevia diariamente, que naquele dia ele não estava com vontade de escrever e assim o título do texto era: hoje não tem crônica. Pois bem, como quem não tem mesmo assunto, começou falando do tempo, já que era um lindo dia de primavera; falou do mar e do azul do céu, pois estava à sua vista o calçadão de Ipanema, ou Copacabana, não importa; falou do amor que langorosa e suavemente lhe inflava o peito; falou do doce gemido do recém-nascido, que talvez fosse o primeiro pedido de benção à mãe, deve até ter falado da paz, que sempre existiu muito mais em nossos pensamentos do que na realidade.
Falou de futebol, pois era domingo e logo mais à tarde, e logo ali, no esplendoroso exmaiordomundo, teríamos o divino coro de muitos milhares, gritando gol. Não me lembro bem, mas creio que também falou de algumas caras reminiscências da sua distante infância, lá na também distante (mas não muito) Itabira, que na sua opinião, expressa em outro momento pois neste não caberia, era “feita de ferro e melancolia”.
Falou bonito, como sabia fazê-lo, e disse do bom, como era de seu feitio; e isto porque não queria escrever, mas a verdade é que a escrita lhe vinha da alma e fluía-lhe por todos os poros, ainda que estes não precisassem dos 95% de transpiração que, ainda segundo ele, era necessário para escrever, sendo que os outros 5% seriam de inspiração. Ironicamente ele devia estar se referindo a mim porque para ele a proporção certamente era invertida.
Mas ele fez o que se propôs, no título: não teve crônica, fomos brindados com uma poesia, o que não me deixou nem um pouco surpreso, pois seus escritos, em grande maioria, são poesias, mesmo quando, em seu cartão de visita, enganosamente nos dizem que são prosa.
Não escrever para ele era isso, mais um Uirapuru a me causar uma tremenda inveja, eu que não ouso cantar como coleiro, e que chego a ter inveja até dos dois netos, calopsitas, que, sempre ao meu lado, são quase tão desafinados quanto o avô.
Não escrever, diferentemente de Drummond, para mim é isto.
Para Malu, inspirado em seu comentário no texto, já citado no início deste, Poeta/Não Poeta, e ainda, aproveitando porque sei que ela gosta muito de Mário Quintana, peço licença ao espírito deste para discordar, e se alguém perguntar, eu explico, como bate um coração “langorosa e suavemente”. Creio que ninguém vai perguntar, especialmente os que leram o grande poeta. Os que não leram podem sair à francesa, então eu não tenho como perder.
Julho de 2013.


Um comentário:

  1. Após um ano que escrevi esta crônica, fui reler a de Drummond, a qual fiz referência e vi que não tinha quase nada do que falei. Ainda bem que não li na época pois não teria escrito nada.

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