domingo, 21 de dezembro de 2014

DAMA (DONA) DA NOITE

UM TEXTO MAIS LONGO E ÚNICO MEU DE FICÇÃO. DIZEM QUE É UM CONTO.

Brilhante Dama

Aos primeiros alvores matinais ela rola na cama, lânguida e relaxada como se tivera uma linda noite de repousante sono, velado por querubins, após ter feito amor por longo tempo, mas não sabe se também com um anjo ou com o próprio deus. Grego. Inspirada talvez por estas divindades decide que será bem especial o belo dia anunciado pela réstia de sol que teima em se esgueirar por entre o cetim do cortinado. Será um dia completo e narcisistamente só seu. Completo sim, de sonhos, desejos, paixões, loucuras, poesias. Delibando-se previamente nas iguarias a ser vividas, alonga todo seu retilíneo corpo e calmamente deixa o leito, imaginando se ele a servirá melhor ainda, naquele mesmo dia. A intrusa réstia de sol já espalha sua claridade e com um leve ardor circula pelo belo corpo, ainda semidespido, e lhe anuncia o bom dia do astrorrei.
Hora da primeira refeição que já se encontra à mesa e nada fica a dever aos Palaces de Paris ou Nova Iorque. É, o dia realmente promete! Cada porção de alimento que vai à boca é mastigada e saboreada longamente e com muito vagar, quase que num ritual zen, em que não existissem tempo, obrigações, relógio. Aliás, o dela quebrou há poucos dias e ela jurou, como se preciso fosse, que não usaria outro. Providencial.
Será que o sol já cumpriu sua rotineira tarefa (o sol, este sim, tem obrigações) de colorir e aquecer águas e areias? Caminhando umas poucas centenas de metros é possível fiscalizar se o trabalho está sendo bem executado. Tão logo chega à praia deserta, ri interiormente ao pensar que o fiscal de ponto da grandiosa estrela é o seu diminuto, branco e bem cuidado pé, que com uma boa dose de sensualidade toca a tépida areia e imediatamente uma ruidosa e ciumenta onda quebra à sua frente e lhe vem, reverenda e mansa, beijar o escultural e atrevido pé.
Espalha pela areia seus muitos apetrechos de mulher e fica em dúvida se seu exigente corpo quer logo a água ou mais sol. Na dúvida, opta pelos dois e mergulha com a elegância de uma campeã olímpica. Em pouco tempo sai da água e preguiçosamente estende-se na toalha para curtir e ser curtida pelo agradável calor.
Sua tarde será dedicada a reposição de forças para o que ela idealizou como o melhor de seu dia. Dormirá após o almoço.
E quando a noite finalmente abre seu manto iluminado por milhões de estrelas, seus olhos brilham como aquelas e maliciosamente ela decide que vai se vestir de noite, seu manto negro será de seda opaca e suas estrelas serão grãos da areia matutina agora transformados em vidro, por fustigante calor mas não mais do sol. Serão miçangas tão reluzentes como se fossem rubis. Ela vai ser a verdadeira dama da noite – nobre dama - tão nobre que suas miçangas mais coloridas parecem mesmo rubis, e as mais pálidas parecem estrelas de uma constelação longínqua, vistas na noite escura. E todos são dela, rubis, estrelas, noite, constelação, miçangas. Ela é a dona do mundo. Da lua não é, pois esta não veio hoje ao firmamento. Certamente não quis tirar uma fatia sequer do esplendor da brilhante dama, ou quem sabe ficou temerosa de que esta brilhasse mais que ela.
Com este sentimento circula sozinha por elegantes bares e boates da moda. Não sabe se procura algo, ou se só quer exibir-se. Beberica em cada um dos lugares e pela madrugada decide voltar, pois não quer ver o sol romper a aurora e decretar o fim de sua noite, posto que em sua imaginação não haverá um fim para este dia/noite que está e haverá de ser tão perfeito.
Um pouquinho alta, caminha pelas ruas e encontra um jovem poeta a recitar versos à noite e seus distantes astros. Parece que aquele jovem teve também seu dia especial e a chama com sua poesia para juntos participarem do supremo ápice – o ato sexual – e aí ela descobre o que ainda lhe faltava. Rapidamente modifica o seu plano solitário e juntos caminham em busca da alcova adrede preparada. Das preliminares ao gozo decorre um longo tempo, quando então dormem embevecidos em cansaço e êxtase. Ao acordar pela manhã, já não tão cedo e, provavelmente pelo adiantado da hora, não encontra ao seu lado o anjo do prazer que lhe fez companhia. Sente-se confusa, não sabe se viveu ou sonhou aquele dia. O sol parece se aperceber disso, pois logo vem acariciar o mesmo pé que lhe aprovou o trabalho. Uma suave brisa sussurra ao seu ouvido: ainda que tenha sido um sonho, ele hoje pode ser realidade. E a dama, despindo-se da lingerie, também negra, começa a pensar em fazer ou sonhar tudo de novo, mas será que um dia tão perfeito se vive mais de uma vez? Ou por ser tão perfeito ele só é mesmo possível em sonhos? Viver e sonhar costumam estar mesmo embaralhados em sua mente. “Uma parte dela pesa, pondera (às vezes), outra parte delira (sempre)”. (Adaptado de Ferreira Gullar.)
A misteriosa dama tem mais interrogações que respostas. Ela também não é muito de procurar respostas, basta-lhe viver e, afinal, “navegar é preciso, viver não é preciso”, conforma-se com um outro poeta.

Stenio, com a colaboração de Tafnes.
Setembro de 2008.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

TENTANDO SOBREVIVER

EU NÃO TINHA A INTENÇÃO DE PUBLICAR ESTE TEXTO NO BLOG, MAS MUDEI DE IDEIA PORQUE ALGUNS ME PERGUNTARAM SOBRE A MINHA LONGA BRIGA COM A CAIXA ECONÔMICA, PARA O QUE ESTOU ESPERANDO (PEDRO PEDREIRO) UM FINAL FELIZ PARA OS PRÓXIMOS DIAS. COMO AINDA SOU MUITO ANSIOSO E ESSA ESPERA TEM SE ETERNIZADO, RESOLVI POSTAR AINDA SEM O FINAL.

Distintos Períodos de Escravidão

Certa vez minha psicoterapeuta mandou que eu escrevesse sobre um período que sempre eu falava como sendo o único na carreira profissional que tinha valido a pena, que o trabalho realmente tinha produzido algo. Não consegui, o tempo em referência foi muito curto, tanto que o batizei de Hiato Profissional, e o restante da vida tentou dominar o texto. Digo tentou porque acabei largando aquele estreito caminho e abracei outros que me pareceram mais largos. Em invectivas contra as guerras, exploração econômica e outras mazelas criadas por e para o homem, enfim, um texto bem depressivo, segundo um ou outro que teve a coragem e a paciência de ler.
Hoje, já decorrido quase um ano, volto ao tema tentando juntar os três períodos (ou separá-los, dependendo da ótica) que considero distintos nos 25 anos em que servi a um só e poderoso senhor: o dinheiro. A estes três segmentos de tempo, assim como D’Artagnan aos mosqueteiros, junto um quarto, anterior e extenso período de 23 anos em que o senhor era irmão bastardo, e tão ou mais poderoso que o outro: a fome. Como não escrevo com o propósito de agradar a alguém, até porque não sei se terei algum leitor, descreverei algumas passagens destes difíceis tempos sem o temor de ser novamente depressivo.
Nasci no meio da roça braba, sem assistência de qualquer espécie, de parto “natural”, que eu diria espontâneo, pois era feito pela própria parturiente. Aqui eu engulo uns cinco ou seis anos e só lembro da mudança para Fortaleza, e a relação entre os valores pagos aos que efetuaram a mesma. Para chegar à Capital, cerca de 70km, pagamos x cruzeiros e dali até o bairro onde passamos a morar pagamos uns 50% a mais, sendo a distância de 3km e percorrida em uma carroça.
Neste bairro passei a ser perseguido por uma faminta e grandiosa porca. Ela não podia me ver que disparava atrás, não lembro se chegou a me morder ou se só queria namorar. Tentando fugir da fome e da porca fui morar com uns parentes no semi-árido, que logo virou deserto durante três anos de seca. Com uns sete ou oito anos de idade abracei a primeira das muitas ruins profissões que tive – vendedor de água – quase lama, buscada a cerca de dois quilômetros e vendida por qualquer tostão já que os sedentos eram também famintos. Salvo pelo gongo do irmão Cocão, na época ainda José Chagas, sobraram-me de herança do período uma bela cicatriz de mordida de jumento e um olho cego que nem posso orgulhar-me, como Camões, de que tenha sido um mouro na guerra, já que foi um amigo e em uma inocente brincadeira de criança. Irrelevante dizer que chorei uns três dias com o olho furado e não lembro o quanto doeu a mordida. Ficaram os traumas, físicos e psicológicos. Da época me recordo ainda da alimentação que era quase ou todo dia um belo cardápio de feijão de corda, bem velho mas também bem temperado – com gorgulho. Vinha de quebra um outro tempero, Gesarol 33, um pesticida usado no feijão, que fedia tanto ou mais que o próprio gorgulho. Recentemente, quase 50 anos depois, fui a Fortaleza e vi o miserável do feijão, novinho, mas já todo furado, e comprei um quilo para mostrar pra meu filho, mas também na esperança que fosse comestível, pois parecia bem diferente do antigo. Não era.
Mais um Severino, retirante do sertão nordestino, que bem poderia ser confundido com o descrito por João Cabral em seu famoso poema, depois musicado e transformado em peça teatral por Chico Buarque. Benditos sejam os que conseguem ver ou transformar em beleza e arte tanta miséria.
Da escola, à qual já cheguei com 12 anos de idade, vale recordar a primeira prova. Na época era semestral e na divulgação dos resultados a professora lia os nomes dos que passavam, de trás pra frente. Eu comecei a suar frio com medo da surra por ser reprovado pois meu nome não aparecia, e quando já me resignara, tomo um susto – primeiro lugar. Era meio que superdotado de memória e não sabia, tudo que era dito durante o semestre, ou o que lia na véspera da prova, eu decorava. Posteriormente este dom foi se perdendo por conta do descuido e do álcool. O período D’artagnan ainda se arrastou por mais onze anos com algumas peripécias aqui e ali mas que não valem a pena ser narradas. Tempo de escravidão da fome mas que eu pensava ser livre. Africano, antes dos navios negreiros.
Sobrevivente, aos 23 anos passo em concurso da Caixa Econômica Federal e, todo eufórico, achei que ganhara a alforria, ou até, o que me parecia à época, um verdadeiro paraíso. Belo engano. Passei a ter o pão de cada dia, o que era um progresso e tanto, mas o navio negreiro, cheio de luzes e lantejoulas, me capturara. Passei a ser escravo dos relógios de pulso e de ponto, subserviente a todo tipo de ordem, muitas delas estúpidas, mas que deveriam ser aceitas pra não perder o já citado pão. Condenado a executar os repetitivos e neurotizantes serviços bancários por um longo tempo. E não nos iludamos, mudar de emprego muito dificilmente mudaria esta relação. Teria que mudar de lado, deixar de ser servo para ser o senhor, de dominado para dominador, o que também não me seduzia muito, apesar de, em meus sonhos eu imaginar ser o que hoje considero o pior destes senhores, o banqueiro. Não tinha talento, dinheiro, força ou imaginação para transformar o sonho, o que eu considerava impossível e talvez fosse mesmo, pelo menos para mim. Apesar de muitos alardearem que, em se querendo, nada é impossível, penso que é, pois as pessoas são limitadas, são bem poucos os super-homens que existem por aí, e estes ainda têm, a aparar suas asas, a criptonita verde. Eu não tenho os superpoderes mas tenho a criptonita que, de qualquer cor, me faz mal. Chama-se depressão e fixou moradia dentro da cachola; corre uma ação de despejo na justiça incomum, especializada em coisas da cuca, mas esta faz jus a fama que tem de lenta e me enrola há mais de quinze anos, mesmo com audiências semanais nas cortes e divãs de suas excelências, os analistas, psiquiatras e outros menos cotados curadores da mente.
Já no banco entrei para a faculdade e foram quatro anos e meio de muita correria. Tinha que fazer milagres, pois trabalhava oito horas durante o dia e as aulas eram no mesmo horário. Deste tempo carrego o dom da ubiquidade. Terminei extenuado, com o aprendizado muito reduzido e que, praticamente não me serviu de nada.
Tentando diminuir as frustrações do trabalho montei uma empresa que rapidamente progrediu e com isso me veio uma agradável surpresa: como eu não dependia mais do banco e quando me aborreciam eu os xingava, os chefetes não se metiam comigo, me largavam num canto qualquer com o serviço e eu o executava a contento. Foi o melhor período de minha vida, dentro e fora do serviço, pra ser mais radical eu diria que foi o único em que realmente vivi. Durou um pouco mais de dez anos e ruiu com a invasão dos turcos otomanos.
Falando de turcos e de chefetes tem uma estorinha rápida envolvendo os dois. No último local onde me largaram funcionavam dois setores e os senhores presidentes, além de muito chatos, não se bicavam. Um dia tinha um pessoal consertando o forro da sala e um destes mandachuvas subiu junto e foi fiscalizar o trabalho, mesmo não sendo na seção dele. O outro ficou embaixo rogando praga para o primeiro cair. E não é que caiu mesmo. Pra completar, como não terminaram o serviço, chamaram um vigilante pra trabalhar à noite e lá pela madrugada este acorda com um barulhão. Assustado, mandou bala pra tudo que é lado até acabar a munição, quando então se trancou numa sala e pediu reforço que tão logo chegou vasculhou tudo e como não viu ninguém, subiu no forro pra fazer a varredura completa. Parece que as pragas do turco (apelido do chato numero dois) ainda estavam em vigor, pois o reforço também caiu. Claro o dia, descobrimos que o invasor era uma pilha de caixas que, mal arrumadas, tinham caído e agora estavam todas baleadas. A realidade, às vezes, supera a ficção. Pastelão dirigido por Gugu Liberato - parêntesis fechado, voltemos ao original.
Assim como muitos dirigentes romanos não tinham aptidão pra ser imperadores eu também não tinha para ser empresário – caiu a Bastilha. Fali e entrei em um segundo período que só não era igual ao primeiro porque trazia intrínsecas as condições que me proporcionaram o terceiro, o Hiato. É que aqueles que se sentiram sem forças em relação a mim durante a minha curta vida de senhor/dono/patrão, viraram novamente He-Man e tinham a força. Por minha vez nem sempre lembrava que tinham revogado a Lei Áurea e aqui e ali brigava com meus capatazes e capitães do mato. Numa dessas fui mandado pro tronco. Estava há mais de 20 anos na parte administrativa, no apoio, na retaguarda (ah! este é o termo) e fui mandado pra linha de frente, pra guerra, para uma agência. O meu Vietnã chamava-se Agência Vila Rubim, escolhida a dedo por ser considerada a mais ruim de trabalhar, era o tronco de verdade.
Não deu outra, em pouco tempo pensei que tavam filmando dentro da agência. Guarda no chão, porrada na cabeça, revólver na nuca. Os dois últimos também sobraram pra mim que portava uma camisa bonita e fui confundido com o Gerente. Ao negar a função levei a porrada e foi a promoção mais rápida que vi na vida, foi mesmo na porrada. Desculpe-me fictício leitor, não pude furtar-me ao infame trocadilho.
Se a depressão vinha sendo contida sem muito esforço, com o choque ela rebelou-se e começou a dar trabalho. Passei a ter síndrome de pânico, tirei seguidas licenças pra tratamento de saúde, não podia ver a Agência, dormia mal ou não dormia. Virei morto-vivo para a empresa vagando em múltiplas seções internas, onde ninguém me queria, e aí os chefetes tinham razão. “A maior lição de vida é que, às vezes, até os tolos têm razão” (Winston Churchil). Fui parar no arquivo morto, certamente lá era o lugar adequado ao meu estado, posto que não existia o setor cemitério.
Ameaçado de voltar à bendita Agência, me aparece a oferta de ir para São Paulo e ainda receber um bom trocado (a estas alturas eu já estava falidão, até como pessoa física), e como não fizeram restrições a malucos ou mortos-vivos, aceitei na hora. Fui!!! “Era o começo do fim, ou era o fim” (Geraldo Azevedo). De lambuja, a grana me foi roubada por um empregado.
Na cidade que não pode parar me mandaram aprender com um paradão, lerdo mesmo, e eu na minha ansiedade, enlouqueci. O serviço era bem burocrático, muito normatizado, e eu não progredia, principalmente por não suportar os métodos do instrutor. Em três dias o gerente me chamou e disse que eu não estava produzindo e, após expor minhas razões ele disse que em meu lugar teria procurado o balcão ao lado e tentado fazer outras coisas. Eu respondi que foi exatamente isso que fiz mas dali pra frente resolvi aprender o serviço a mim designado, sozinho. E consegui! Passei a atender isoladamente e de forma bem satisfatória.
Em poucos dias o mesmo Gerente começa a fazer pressão para que vendêssemos uns micos que a Caixa inventara, no afã de equiparar-se aos lucrativos bancos privados. Todos os dias a bela secretária estagiária passava com uma lista anotando quem vendera ou não um papel podre. De tanto insucesso, ele, que assim não ganhava suas comissões, resolveu apelar para uma premiação extra pra quem vendesse mais. E o prêmio era em dias de folga, o que seduzia bastante pois quase todos os empregados eram “estrangeiros”, e passar um dia ou dois a mais com a família era muito tentador. Resolvi aderir, e utilizando a experiência adquirida em minha falecida empresa de vendas de carros, passei a empurrar nos clientes, seguros diversos, bilhetes de loteria, poupança premiada, previdência privada e até papel higiênico usado, se preciso fosse. Resultado: ganhei, em primeiro ou segundo lugar, todas as folgas, e junto, algumas inimizades que foram bem úteis em um futuro próximo.
Aqui começa o já citado Hiato Profissional. Trabalhando no setor de habitação e lidando com meu público favorito, os carentes, vi que a Empresa oferecia muitas formas de resolver as pendências existente, que também eram muitas. Especializei-me nestas pendências, li bastante sobre o que era permitido ou não e passei a resolvê-las melhor que os outros, chegando a gerar filas exclusivas para o meu atendimento, o que acirrava novamente o ciúme e as birras de alguns colegas que não conseguiam fazer igual. Reclamações com a nova Gerente, que me chamou a atenção, e eu, achando que estava certo e já em estado eufórico/depressivo, nem liguei. Finalmente estava trabalhando e produzindo de verdade. De tão eufórico, utilizei todas as normas e quebrei algumas para resolver as coisas em favor de meu público. No item quebra de normas cometi uma grave e estou pagando até hoje. Os recém-adquiridos inimigos montaram em mim. C’est fini. Foi mesmo, fui demitido, depois aposentado por invalidez já que a depressão só piorava, e como perdi minha aposentadoria complementar estou, não em total, mas em meia miséria. Pelo menos mudei de patrão, sou funcionário de Deus e dizem que ele cobra sim, mas só depois que o defunto é enterrado e aí, sabe, depressivo não liga muito pra isso não. Se Ele cobrar caro depois eu mando um e-mail explicando, para que outros não Lhe fiquem devendo.
Muita gente afirma: minha vida dá um livro. A minha não deu nem dará certamente; apenas estas poucas e insípidas páginas. A inveja que tenho hoje é de algo que me parece tão distante quanto o sonho de ser banqueiro, embora aparentemente mais fácil e bem mais estranho: um epitáfio. Do milionário americano Malcolm Forbes “enquanto estava vivo, viveu”.

Stenio, nos últimos dias, epa, de agosto, 2007.










domingo, 12 de outubro de 2014

A DANADA DA ROSA

ESTE, LAMENTAVELMENTE NÃO É MEU. É, COM TODA HONRA, PELO MENOS ATÉ AGORA, O ÚNICO DO BLOG QUE NÃO ESCREVI. E COMO GOSTARIA DE TÊ-LO FEITO. EXISTE TAMBÉM EM VERSÃO MUSICADA, BEM MENOR. DELICIEM-SE.

A Rosa
Chico Buarque/1979




Arrasa o meu projeto de vida
Querida, estrela do meu caminho
Espinho cravado em minha garganta
Garganta
A santa às vezes troca meu nome
E some

E some nas altas da madrugada
Coitada, trabalha de plantonista
Artista, é doida pela Portela
Ói ela
Ói ela, vestida de verde e rosa

A Rosa garante que é sempre minha
Quietinha, saiu pra comprar cigarro
Que sarro, trouxe umas coisas do Norte
Que sorte
Que sorte, voltou toda sorridente

Demente, inventa cada carícia
Egípcia, me encontra e me vira a cara
Odara, gravou meu nome na blusa
Abusa, me acusa
Revista os bolsos da calça

A falsa limpou a minha carteira
Maneira, pagou a nossa despesa
Beleza, na hora do bom me deixa, se queixa
A gueixa
Que coisa mais amorosa
A Rosa

Ah, Rosa, e o meu projeto de vida?
Bandida, cadê minha estrela guia
Vadia, me esquece na noite escura
Mas jura
Me jura que um dia volta pra casa

Arrasa o meu projeto de vida
Querida, estrela do meu caminho
Espinho cravado em minha garganta
Garganta
A santa às vezes me chama Alberto
Alberto

Decerto sonhou com alguma novela
Penélope, espera por mim bordando
Suando, ficou de cama com febre
Que febre
A lebre, como é que ela é tão fogosa
A Rosa

A Rosa jurou seu amor eterno
Meu terno ficou na tinturaria
Um dia me trouxe uma roupa justa
Me gusta, me gusta
Cismou de dançar um tango

Meu rango sumiu lá da geladeira
Caseira, seu molho é uma maravilha
Que filha, visita a família em Sampa
Às pampa, às pampa
Voltou toda descascada

A fada, acaba com a minha lira
A gira, esgota a minha laringe
Esfinge, devora a minha pessoa
À toa, a boa
Que coisa mais saborosa
A Rosa

Ah, Rosa, e o meu projeto de vida?
Bandida, cadê minha estrela guia?
Vadia, me esquece na noite escura
Mas jura
Me jura que um dia volta pra casa


quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O PROFESSOR E A URUBUZADA

A COISA QUANDO ANDA RUIM, NADA DÁ CERTO E POR MAIS QUE O URUBU REZE, O BOI NÃO MORRE E ELE, URUBU, FICA SEM COMER. É A LEI DE MURPH, NA QUAL EU NÃO ACREDITO, MAS FALA QUE SE ALGO PODE DAR ERRADO, VAI DAR.

Praga de Passarinho

Como sou muito bom no ramo de rogar praga, logo me vieram à mente vários títulos para este texto. Praga de Urubu, que no Ceará, minha terra, dizem que é muito forte, tanto que faz o de baixo cagar no de cima. Praga de madrinha que de acordo com Tom Jobim, não tem perdão, pega que nem chiclete em sola de sapato. Praga de turco, que certa vez fui vítima de uma, e como turco gosta de economizar em tudo, ele aproveitou e jogou logo em dois. Tive que utilizar meus santos fortes, e me livrei da bendita, e aí o outro alvo caiu sobre a minha mesa, quebrou esta e a bunda, foi parar no hospital. A mesa quebrada não satisfez o praguento e à noite minha parte ainda estava em vigor, aí um outro caiu no meu lugar indo parar no mesmo hospital. Praga de baiano, que normalmente vem acompanhado de uma boa mandinga, e aí quem se livra? Há algum tempo tivemos aqui na Caixa Federal do ES um gerente regional muito chato que desagradou a bastante gente. Juntamos eu e mais meia dúzia de bons de praga mas, o melhor que conseguimos foi mandá-lo para a Bahia. Eu fiquei a duvidar de meu poder pragatório mas, menos de um ano depois o disgramado ganhou uma de baiano. Resultado: perdeu a função e como prêmio foi atender no balcão de uma Agência onde o gerente era um inimigo seu. Acho que a minha, como a do turco, ainda estava em vigor.
Com tudo isso, por que prevaleceu então Praga de Passarinho? Ora, se eu pusesse o nome de Praga de Urubu, ele poderia alegar preconceito de cor, pois é meio escurinho; se fosse de madrinha eu estaria sendo injusto com estas que normalmente são boas e meu passarinho não o é; de turco, aí seria injusto com ele pois turco não dá nem bom dia de graça e ele me dá: faz muitos filhos, que eu vendo para os mercadores, como os turcos fizeram com José. Então só restava Praga de Baiano e quando ele chegou aqui era mesmo meio baiano pois só queria saber de cochilar, tanto que ganhou o nome de Professor, em homenagem a minha mulher, que ensinava na escola pública, acordava muito cedo e passava depois o dia dormindo. Mas ele passou de fase e hoje é bem esperto: pra fazer filho e rogar praga!
Passadas as preliminares, e como não vai ter meio de jogo, vamos aos finalmentes. Que praga braba foi que este moleque me arranjou? Depois de 13 (tinha que ser 13?) anos de briga de morte com a Caixa Econômica, eu finalmente venci um round, e recebi uns trocados. Rapidamente minha nega inventou que eu tinha que tirar passaporte, e nem vou dizer pra onde ela quer ir, pra não dar azar ou ganhar mais uma praga. Fomos então tirar o tal do passaporte e tinha que passar primeiro no computador. Passamos e ele, nem sempre tão inteligente, nos mandou para a sede da Polícia Federal em São Torquato, Vila Velha, na divisa com Vitória. Lá pegaríamos somente uma informação mas, os bem mais inteligentes humanos nos mandaram lá para o Shoping Vila Velha, que é no outro extremo. Eu já quis voltar dali, mas minha paciente mulher insistiu e lá fomos nós. Conseguimos a informação mas, mas, mas, eu teria que tirar uma nova identidade porque a minha é de 1969 (será que não vale porque foi emitida pela ditadura militar?). Aqui eu zuretei e falei que não ia mais pra lugar nenhum, que ela fosse com quem quisesse, mas ela não se deu por vencida e na calada do dia, convocou a Angelita, que com seu jeito manso e pidão sempre me convence de tudo. Fui eu junto com ela, Angelita, que logo inventou que também precisava de identidade. Eu já na minha quarta idade teria direito a atendimento prioritário mas nem quis, pois teria mesmo que esperar por ela; mal sabia eu que a praga do Professor já começava a fazer efeito. Angelita rapidamente foi atendida e eu seria o próximo, mas este próximo não estava nada próximo e lá estamos nós esperando um tempão. Ameacei novamente vir embora e Angelita foi reclamar. Resultado: meu nome não constava no computador e lá me fui pra fazer tudo de novo, e para completar minha raiva, assim que terminei, acharam a primeira ficha. Como já não tinha ninguém no posto fui direto tirar as digitais mas no curto espaço percorrido dei uma olhada no preenchimento e lá estava como minha mãe, minha ex-mulher, da qual me separei há quase vinte anos. Voltei para fazer a correção e a pessoa tinha saído, parece que teve uma dor de barriga, e nem vi se voltou. Uma outra pegou, corrigiu(?) e mandou eu sujar meus dedos. Fiz, mas rapidamente ela constatou outros erros e lá vou eu novamente na minha via sacra. O pequeno erro agora era que na minha certidão de casamento constava minha mãe como pai e a ex como mãe. E eu imaginando que o casamento gay fosse coisa recente!
Afinal, porque descobri que era praga do passarinho? Quando chegamos da primeira viagem, onde não aceitaram minha identidade, ele me irritou com alguma coisa e eu o chamei de “carteira de identidade falsa”, e na viagem seguinte, as minhas três ou quatro é que eram falsas. E com efeito retroativo, pois até a certidão de casamento, feita há mais de trinta anos, também estava ruim. Tô achando que, pelo alcance, podia ter chamado esta de praga de urubu, e daquelas que pegam em cristão!
Agosto de 2013.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

VISÃO SOBRESSALENTE

É O QUE PARECE QUE POSSUEM OS DENOMINADOS "DEFICIENTES VISUAIS" POIS ELES, NA VERDADE, ENXERGAM MUITO MAIS QUE A MAIORIA DOS QUE SE DIZEM VIDENTES. COMO SÃO OBRIGADOS A UTILIZAR OS DEMAIS SENTIDOS DE FORMA MAIS AGUÇADA QUE NÓS, PASSAM A TER QUATRO SENTIDOS EM TOTAL OU QUASE TOTAL DESENVOLVIMENTO CONTRA CINCO NOSSOS A MEIA BOMBA.

A Terceira Visão

A imaginação é mais importante que o conhecimento.
Penso 99 vezes e nada descubro. Fecho os olhos, mergulho no silêncio e a verdade me é revelada.
Estes dois pensamentos de Albert Einstein são para mim bastante surpreendentes pois fui acostumado a ver diretamente com os olhos, a pensar para buscar as soluções, enfim, o mergulho interior ficou para o divã do analista.
Convivendo durante algum tempo com um cego tive a oportunidade de verificar na prática o quanto os dois pensamentos estão corretos, mas ainda assim, teimosamente, achei que os conhecimentos demonstrados pelo meu amigo Dílson vinham de seus estudo, esforço e inteligência. Ele bem poderia ter-me presenteado com um pouco da sua imensa sensibilidade. Quem sabe o fez, mas...
No princípio dos tempos, antes do pecado, o homem seria perfeito, posto que obra do Senhor, e como tal, portador de sua sabedoria. Com a “queda” do anjo perdeu-se o diamante da terceira visão e a sabedoria, assim como o pão, passou a nos custar o suor do rosto, pois só vem à luz com muito estudo, conhecimento do todo e, principalmente, de nós mesmos. Os que não vêem diretamente com os olhos parece que adquiriram o tal diamante já que, na maioria das vezes enxergam mais que nós, ditos videntes. E ainda não precisam submeter-se a nenhuma cirurgia sem anestesia, como descrita no best seller de Lobsang Rampa, do qual subtraí o título deste.
Como a introspecção e o auto-estudo lhes são característicos a equação se completa com a lição do gênio da Física que para eles é automática, obrigatória e gratuita.
São especialistas naquilo que resolvem fazer e, mais ainda, na superação de deficiências, quer sejam visuais ou não. Como exemplo maior podemos citar o astrofísico Stephen Hawking, que aos 21 anos teve diagnosticada a doença que o paralisou, com expectativa de vida de mais dois anos. Está com 65, casou duas vezes, teve três filhos, é ganhador de Prêmio Nobel e tem prevista para 2009 uma viagem espacial. Ganhar Nobel de Física é fácil, eu queria que ele me dissesse é como se geram filhos movendo apenas dois dedos e um computador. Hipertrofia de outras funções? Testosterona e esperma saindo pelas tabelas, ou melhor, pelos poros.
No Brasil encontramos maravilhosos atletas paraolímpicos como Ádria Santos, que correndo não enxerga ninguém à sua frente, Clodoaldo Silva, que nada como um tubarão australiano, mesmo com as nadadeiras inferiores prejudicadas por paralisia cerebral e Roseane Ferreira, a Rosinha, que foi empregada doméstica e, após perder uma perna, atropelada por um caminhão, tirou da pobreza e sofrimento a força necessária para bater os recordes de arremessos de disco e de peso. Os dois primeiros brincam de revezamento pra ver quem ganha mais e juntos somam 33 medalhas paraolímpicas!
Às vésperas de Copa do Mundo de 1970 o então treinador João Saldanha deixou Pelé no banco de reservas alegando que o astro portava miopia. Mudou o treinador e o resultado se conhece muito bem. Em nossos dias o cronista esportivo Armando Nogueira, comentando o fato, disse que “Pelé não precisava ver com os olhos já que ele enxergava por todos os poros”. É, os poros dessa gente são mesmo multifuncionais.
Como nem tudo são flores tem a estorinha do Alexsandro Viana que numa partida de xadrez com um cego entrou num final acelerado (quando faltam apenas cinco minutos para cada jogador) e mesmo com vantagem decisiva, perdeu o jogo. Foi bonito ver a alucinante velocidade táctil funcionando como condutores elétricos ligados diretamente ao cérebro, que respondia rápido, rasteiro e preciso, e o adversário sem saber se jogava ou usufruía o raro momento. E outra em que o cego perdeu diversas peças e ao abandonar a partida e cumprimentar o parceiro comentou: eu não vi nada! Ora, companheiro, console-se comigo que, dizem, enxergo um pouco. Só não esqueça de me mandar os direitos autorais, pois esta frase é minha e não me canso de repeti-la.
A Natureza, ou que seja, Deus, se não tem três olhos, certamente tem três mãos, e quando com uma tira, faz também seu mergulho interior e, lá mesmo no divã, quem sabe com alguma dor de consciência, junta as outras duas no pródigo ato de compensar.
Junho, 2007.
Stenio, com a colaboração do Olho (bem) Mágico do Instituto Braille.
Dedicada ao amigo e forte enxadrista Rodrigo de Souza.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

DOIDOS DO XADREZ

POSTEI ESTE EM TEXTOS DE AMOR E HUMOR, COMO NORMALMENTE FAÇO POSTO AQUI TAMBÉM, POIS É OUTRO PÚBLICO.

Meu Universo


Muita gente diz que o jogo de xadrez agrupa ou transforma em malucos os que o praticam. Eu que faço parte da panelinha, naturalmente discordo, mas algumas estorinhas, passagens rápidas, ou personagens que não têm muito a ver com maluquices, podem ser registradas. Como quase todos os que estão no metiê viveram ou possuem alguma coisa incomum, fica difícil imaginar por onde começar, e pra não dizer que tal pelo início, vamos começar, como Machado de Assis em Brás Cubas, pelo fim – a bomba atômica.
Dois dos mais bizarros personagens, (um está foragido e o outro bem ativo entre nós) foram jogar em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Lá pela terceira rodada não tinham feito ainda nenhum ponto e o foragido, forte jogador, tava puto da vida. Convidou o outro para dar uma volta pelas redondezas, conhecer a cidade. Muito bem, montaram na moto e andaram uns 30km no meio do nada até chegar a uma enorme construção, muito vigiada, onde o condutor pediu ao carona pra descer e pegar informações do que era aquela grandiosidade. Enquanto J. perguntava, Daniel se mandou deixando o companheiro dentro da usina atômica em plena era do vaga-lume. Era este o nome da aberração, na época de testes, e hoje, pelo que me consta, apagou de vez.
Um outro, e este definitivamente eu não posso falar ou me escapa o nome, em um período meio depressivo/paranóico, inventou de brigar com um caminhão. Ia ao banco ou supermercado e lá estava o bicho bem parado no meio do caminho. Começou a fugir, dobrar na esquina, fazer o caminho mais longo, mas ainda assim a nóia fazia ele ver o caminhão. Rogou-lhe uma praga e o monstrengo foi roubado, mas parece que o proprietário tinha seguro porque comprou um outro, só que bem menor, e nosso personagem tá até hoje implicando com o toco de caminhão (no Ceará é cafuringa) e rogando mais praga, já que a principal só pegou pela metade.
Agora uma que vale pra dois, um de cada lado e no meio... um tabuleiro, é claro. Os até então amigos possuem mais ou menos o mesmo nível de jogo, mas um estava com uma boa vantagem material e o outro, vendo-se perdido, mas possuindo uma grande visão tática, procura inventar e apronta mate indefensável em dois lances. Nosso ex-vencedor, inconformado, passa bastante tempo procurando uma saída, e o outro, brabo com a demora, abandona a partida. Dizem que quem pagou pelo desaforo foram a geladeira, que teve um copo amassado contra si, e a dona da casa que, paciente, foi juntar os cacos.
Esta eu já contei, mas como o contexto é outro, vou me repetir. Um quase-como-eu, cego (de verdade), jogava um torneio de alto nível e tava indo bem, ganhava um pontinho aqui, meio ali, ficou empolgado, tomou umas biritas e foi jogar a última do dia. Irreconhecível, perdeu várias peças e ao abandonar a partida comentou: eu não vi nada! Realmente, nem sentiu (que tava bêbado).
Temos vários filósofos, tantos que não dá para falar de todos, então citemos uns dois: o epicurista Dr. Tarcísio, ou como diz o Eduardo, o Tarcisião, fazendo jus ao princípio de sua filosofia, comia, bebia, fumava e fazia mais algumas estripulias sem muitas limitações. Em dia inspirado, jogando com um desses fortes e jovens jogadores que surgiram ultimamente, aplica-lhe uma bela sova. O menino perdeu literalmente o caminho de casa, veio comigo e não achando como justificar a derrota saiu-se com essa: eu não sei como pode, um cara que é médico, bebe, fuma, faz o que ele faz. E eu calado pensando: exagera até em jogar bem o xadrez.
Um outro, sofista, tem uma pérola de quatro letras como máxima: se é, é. Sábio, muito sábio. Eu que freqüentava bastante a sua casa e como sou do ramo, um dia levei lá um cego. O cara não via com os olhos, mas com os ouvidos... foi só o fulano começar a conversar ele sapecou-lhe um belo apelido – xarope – depois me explicou o porquê: o troço é doce mas muito enjoado, serve pra enganar criança ou pra quem tá quase surdo, de gripe. Se é, é.
E aquela do André que foi arbitrar um torneio em Guarapari e à noite foi conosco a uma pizzaria tipo rodízio. Como a despesa dele era por conta da organização, pediu o cardápio mais caro, que dava direito a comer 99 sabores diferentes. Ele não perdeu tempo, disse que ia experimentar todos, mandou ver, comeu, comeu, não sei onde coube tanta comida, mas o que sei de fato é que o restaurante faliu e até hoje o prédio está entregue às moscas.
Um da turma mais antiga diz que não é doido, mas bate na mãe, e como eu não gosto de quem bate na mãe, nem vou comentar. Outro foi comigo visitar Sérgio Nasser, que estava internado. Serjão, inteligente como era, manda-o sentar-se na cama e em pouco tempo chega a enfermeira com uma baita injeção, vai aplicar em Benigno que já está deitado, e este diz que não é ele o doente e a enfermeira retruca: é, meu amigo, aqui todo mundo diz isso. Detalhe: a clínica, óbvio, era psiquiátrica. Na mesma clínica, depois que saiu, Serjão inventou (?) que tinha um bode e o mesmo quis comer suas calças. Disse que a enfermeira deu a ele um porrete pra se defender do enorme e fedido caprino e aí ele desatinou de vez: um bode dentro da clínica e a enfermeira dá um pau ao interno. É, ele deve ter mesmo inventado. Saudades, amigo, desafie Capablanca, Lasker e Alekhine, reze uma boa oração para todos os santos, e bata nos três monstros sagrados.
Tem também o velhinho que se recusou a jogar com as peças vermelhas, tem o filósofo pericliano/ornitológico, tem aquela artista que fez uma bela apresentação em Pinheiros, tem aqueloutro e mais um outro. São tantos que talvez renda mais um texto (duro de ler II) e, pra terminar, como aqui não tem estória de doido, resta dizer que o caderno que contém estas anotações é escrito de trás pra frente, só não me ocorre agora o motivo.

Setembro de 2007.
Colaboração das lembranças de Ana Paula.

domingo, 13 de julho de 2014

SAUDADES

O BOM, PARA QUEM NÃO TRABALHA MAIS, COMO EU, É QUE A SEGUNDA JÁ NÃO É TÃO CHATA, FICA IGUAL AO DOMINGO. ENTÃO EM HOMENAGEM AO DOMINGO/SEGUNDA E AO NÃO TRABALHAR VOU RECORDAR DO TEMPO QUE EU FAZIA ALGUMA COISA.


PROFISSÕES


“O meu nome é Severino, não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria, deram então de me chamar Severino de Maria como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias”. João Cabral de Melo Neto.

Por ter nascido muito pobre logo cedo tive que abraçar algumas profissões e muitas delas não foram das melhores.
Minha mãe contava que antes dos cinco anos eu era intermediário de compra e venda. Comprava fiado na esquina e depois perturbava para me darem o dinheiro para eu pagar. Como as recordações não são minhas não sei se já cobrava comissão.
A primeira de que me lembro foi a de vendedor de água. Até que deveria ser um bom negócio pois era no sertão nordestino em época de longa seca. Tinha uns pequenos problemas como a distância, uns dois quilômetros; a água, que de tão barrenta parecia lama; o meio de transporte, lombo de burro, (o que vos fala); e o pior, os sedentos eram também famintos, e nem sempre tinham meia pataca para me pagar. Acrescente-se a minha idade, na época: uns sete, oito anos, no máximo.
Ainda no semi-árido e neste mesmo período de seca, fui mineiro, catava umas pedrinhas escuras e brilhosas que depois fui informado que poderia ser rutila. A encrenca era que a tal pedrinha aparecia muito pouco e somente no período mais quente, talvez por se acentuar o brilho.
Ainda no sertão mas já em um outro período, lembro de um tempo em que fui tropeiro de burro, conduzindo terra para as barragens de açude. Não era uma profissão ruim exceto pelo pagamento que era feito com um tal de sunguelo, que depois era trocado por feijão furado e rapadura. Em seguida fui apanhador de feijão, milho ou algodão e este último demorava bastante para juntar um quilo, que era remunerado com uns dez centavos, talvez menos. Molhar sairia mais caro, pela falta d’água, e se colocasse areia ou pedra só passava uma vez, depois perdia o emprego. Deste tempo lembro ainda que era tão quente que a gente ia de madrugada para o roçado e voltava umas nove ou dez horas da manhã, quando já não conseguia permanecer no sol. A água que se bebia durante o trabalho era tirada da melancia verde e não matava a sede pois era também muito quente.
Até aí eu não frequentara a escola regular, que só iniciei aos doze anos, já em Fortaleza, mas aprendera a ler.
Na capitá fui carregador de feira, vendedor de bala, de banana e até de tapioca, aqui no Sul conhecida como beiju. Como vendia muito pouco não esquentava lugar. Uma venda que durou um pouco mais foi a de pão, e nesta o horário era mais ou menos o mesmo do roçado, da madrugada até as nove, mas a diferença é que agora eu já ganhava um trocado até bom. Acabou porque meu irmão, que era o mestre padeiro, sumiu pras bandas do Piauí e levou o dinheiro de pagar a padaria. Bom também nesta profissão é que eu não precisaria pagar academia pois andava de oito a dez km com o cesto nas costas, cheio ou vazio. Antes dessa, veio uma outra também interessante pelo inusitado: carregador e batedor de caixão de defunto, e defunto porco (porco mesmo). Explico: Eu era empregado mirim do matador de porco e depois de vender a carne ele saía para vender o sarapatel e como o moleque, apesar de bem forte, não queria levar o peso, lá ia eu com uns quinze quilos na cabeça, na frente dele, batendo no caixão. Pleco, pleco, pleco. Cada meio quilo vendido era como tomar um Dorflex.
E o miserável logo atrás, aos berros: buiiiiiií de porco toucim e banha! O buí era a forma mais fácil de ele conseguir falar sarrabulho, como é conhecido lá o conjunto de miúdos do bicho sujo. Um outro irmão meu (tínhamos uma boa safra) certa vez foi preparar um pouco aqui em casa e não lavou direito. Como reclamamos, ele argumentou: o porco era limpo! Então tá bom.
Fui vendedor em duas mercearias, uma quebrou e na outra o proprietário não me pagou nada, certamente achou que eu roubava, mas o que eu catava mesmo era uns pedacinhos de queijo, que comia escondido. Foi um pagamento melhor que dinheiro. Por linhas tortas, ele foi justo.
Arranjei um emprego público mas em oito semanas acabou meu mandato, ou melhor, do político, e eu, bem, eu como já estava acostumado, fui pra rua. Ligeirinho no serviço público.
Fui trabalhar em uma fábrica de móveis e de enrolar os outros. Em cada três vendas o sujeito deixava uma sem entregar ou demorava pelo menos um ano, já tendo recebido a metade ou mais do valor. Ele vivia se escondendo dos clientes e ainda assim fiquei lá uns três anos embora não tenha aprendido a profissão de enrolador. Será este termo por demais eufemista?
Mas, a meu modo, passei também a enrolar. Meu irmão (mais um) montou uma oficina de reforma de móveis e eu era o procurador de serviços e, como era diferente dos demais e precisava comer, eu executava alguns destes serviços com toda a inabilidade que sempre tive em trabalhos manuais. Profissão: bombeiro enganador. Pode até soar, mas não é encanador, é enganador mesmo. Explicando novamente: bombeiro, no Ceará é o operário que faz tudo mal feito e enganador é o superlativo do termo. Só pra se ter uma ideia das minhas “mágicas” soldava cadeira de ferro (cano) com um cabo de vassoura e cola. Com esta enrolação sustentei a casa durante uns seis anos.
No período do último ano fiz hora extra: estudei todas as noites e aos domingos, durante o dia. Foi o que me salvou a pele pois no colégio não tinha aprendido quase nada e quando fui fazer meu único concurso público, passei entre os primeiros. Maravilha, iria ser bancário num grande banco público! O que descobri depois é que, neste ramo os serviços, repetitivos e neurotizantes, fazem com que um bom percentual ao se aposentar esteja meio maluco ou bem depressivo, que é o meu caso. Esta profissão tem um epíteto bem menos nobre: auxiliar de ladrão. É uma atividade tão insossa que pouco teria a relatar no longo período em que a exerci.
Me aposentei meio na porrada, literal e figurativamente falando. Literal porque levei umas porradas de um assaltante dentro do banco, e eu que já apresentava um quadro depressivo, piorei bastante. Comecei a fazer bobagens dentro do serviço até que fui expulso e aí tive que apelar para a porrada figurativa para conseguir a aposentadoria, pois os analistas achavam que eu não tinha trabalhado ainda o suficiente. Devem ter razão, eu é que já nasci errado. Ou como diz outro irmão (desta vez adotivo): todo torto!
Com a aposentadoria pensei em realizar um antigo sonho: ir à Europa, visitar Paris, subir na Torre Eiffel, passear às margens do Sena, tomar um porre no Quartier Latim, ver as raridades do Louvre. Isto tudo, toda a mágica, teria um nome: Fundo de Garantia. Até agora o que rendeu foi dois passarinhos comprados por meu filho (raspa de tacho), e uma nova profissão que ele me arranjou: espantalho. Como tem um gavião nas redondezas e eu é que não saio de casa, voltei ao roçado e a função deve ser tão ruim quanto as outras daquele tempo. É mole ou quer mais?

Stenio, novembro de 2009.

PS: Meu “raspinha” (14 anos, 1,80m) sempre me recorda de uma outra que, apesar de não ser tão bizarra, era bem traumatizante para uma criança de uns oito ou nove anos: caçador noturno de cascavel. Não citei para não dramatizar demais o texto que alguns já acham pesado.

S.


quarta-feira, 2 de julho de 2014

VIDA SEVERINA


ATUALMENTE TENHO O PÃO DE CADA DIA MAIS OU MENOS ASSEGURADO (SE O INSS NÃO FALIR...), MAS JÁ PASSEI ESSES PEQUENOS APERTOS.
COMO APARECERAM MAIS DOIS OU TRÊS SEGUIDORES NO BLOG, E TAMBÉM TEM HAVIDO MAIS VISITAS POR CAUSA DOS AMIGOS DA CAIXA, REENCONTRADOS, ESTOU POSTANDO, MESMO JÁ TENDO FEITO ISSO NO FACEBOOK.

Mais Encomenda

Na minha infância fiquei um período afastado de minha família, deve ter sido dos seis até os dez anos de idade, e neste tempo morei no interior, onde conseguia o feijão com farinha, o que, na casa da minha mãe, solteira, sem trabalho fixo e com um monte de filhos, era bem mais difícil.
Fui resgatado, quando nem mais queria, pelo irmão Cocão, na época ainda conhecido por José Chagas, e fui morar na Bela Vista, numa casa de quatro cômodos pra dez ou mais pessoas. Nós éramos em sete, porque dois casaram e um outro morava com parentes no interior mas para compensar estes minha mãe logo recebeu o sobrinho Aloisio, que foi para a Capital com o intuito de estudar, e quase sempre tínhamos junto um ou mais dos irmãos dela, e mais um agregado, o Cobra.
Como normalmente ninguém conseguia emprego, vivia aquele monte de homens dentro de casa, fazendo bagunça, jogando baralho escondido da mãe, ou bola no meio da rua, e nesta última hipótese tinha também que vigiar o ônibus pois o irmão mais velho batia nos outros, se os encontrasse jogando bola.
Um outro irmão, já adulto, também conseguiu algum serviço, além do Aloisio e o Cobra, e logo nós estávamos tomando o dinheiro deste último no batidim (ou relancim, espécie de jogo de baralho). O Aloisio, muito comportado, não jogava, mas mesmo assim o salário dele só dava pra pagar o colégio e o ônibus. Diz ele que jogava bola, mas devia ser no meu lado cego.
Diante de um panorama desses, a gente tinha algum divertimento sim, mas quase sempre era à custa da miséria de um ou de outro, pois era o que permeava o nosso dia a dia.
Minha mãe já trabalhava, mas como doméstica, e ainda de gente quase tão pobre quanto nós, recebia meio salário mínimo, ou menos. Assim, quase sempre tínhamos que vender o almoço para pagar o jantar e neste sufoco o Aloisio sofria mais que os outros, com os dois turnos de trabalho e a escola noturna. Minha mãe, tentando protegê-lo, fazia um prato e escondia, pra gente não comer, mas como na casa não tinha muitos esconderijos, e com tantos famintos procurando, invariavelmente, ele ficava sem. Um irmão mais sacana começou a deixar o prato coberto e vazio para Aloisio descobrir e não ter nada dentro. Depois de uns três dias caindo no truque, ele começou a levantar o prato para deduzir, pelo peso, se tinha comida ou não. O sacana logo viu que não tava tendo mais graça e passou a botar areia, para ficar pesado e rir mais ainda, quando o faminto sentisse o peso e achasse que tinha comida.
A casa era infestada de ratos e o mesmo irmão mais sacana, armava a ratoeira com a isca de goiaba, já que do queijo, claro, não tínhamos nem o cheiro. Tio Maneo, também muito espirituoso, desarmou a ratoeira com todo o barulho e ainda imitou o ruído do rato imprensado. Rapidamente o Antônio correu pro local falando: ande bichim, coma goiaba! Foi um sacana sacaneando o outro, e todos nós rindo.
Já adulto, certa vez fui em uma fazendola da qual fora coproprietário e vendi minha parte para o outro sócio. A esposa dele pediu para eu fazer um poema sobre a fazenda, e eu disse que ia pensar, mas estava decidido a não fazer porque eu só via ali, miséria, exploração do homem pelo homem, e até trabalho infantil, utilizado pelos pais dos menores. Ao chegar na cidade ela mostrou uma montanha e disse que era linda, e também pediu uma poesia. Eu olhei e o que vi foi uma favela subindo morro acima e também pensei: porra, eu não sou João Cabral (de Mello Neto), para transformar miséria em beleza. Depois de alguns dias acabei juntando os dois pedidos e atendi à pedinte, todavia não mandei para ela a encomenda, por motivos óbvios.
Desta vez também eu estava decidido a não escrever para não expor misérias, e quando iniciei pensei também em não mandar, mas como agora eu conheço mais o pidão e sei que aguenta: taí.
Como um prato cheio de areia, anexo, abaixo, o poema.



MODERNIDADE


Sol a pino, mulheres (ocidentais) de burca
Suando em bicas a colher abóboras.
Crianças dão sal ao gado, embalam verduras
Trabalho no campo: exaustivo, inglório, ilegal.

Um ninho de passarinhos, com fugas e cantos
Ao lado da casa “sede”, nem sequer é visto
Não há tempo para deleites, romantismos.
A sobrevivência é que lhes dita o dia a dia.

E o trabalho infantil, e a extorsão das mulheres
Vai parar na minha mesa, normalmente farta
E na de gente ainda mais exploradora.
Triste ser humano que seus escravos perpetua.

Os burros de carga coexistem com avançadas
Tecnologias, e estas que a bem poucos beneficia.
Bela musa me diz, como se pode escrever poesia?
Preciso que um bom médium me evoque

De Castro Alves o espírito pra escrever com alma
Sobre escravos modernos, que nem são africanos
E um encosto de João Cabral que me transmita
A fórmula mágica de dizer que a miséria é bela.

Mas a não muitos quilômetros, já na cidade grande
Mesmo que forçado, o povo pobre faz a poesia
Empurrado morro acima na bela montanha
Que desmorona em versos que à musa contraria.

E à noite, quando as luzes mais baixas e mais ricas
Sucumbem à imensidão de vaga-lumes
Me regozijo e, pra não dizer que não falei de flores
Vejo ao longe e bem alto uma via láctea. Belíssima!

Março, 2013



sexta-feira, 6 de junho de 2014

Carona na Morte







O PESSOAL QUE TRABALHA COM PUBLICIDADE DE LIVROS OU FILMES COSTUMA PEGAR ESTA CARONA QUANDO ALGUM AUTOR OU ATOR MORRE. NO CASO É USADA A CARONA PARA DAR MAIS PUBLICIDADE À OBRA OU DESPERTAR A CURIOSIDADE DO PÚBLICO. ESTOU FAZENDO O MESMO POIS JÁ TINHA ESCRITO ESTE TEXTO E NÃO PUBLICADO, MAS GARCIA MARQUEZ MORREU...

Insights Mediúnicos

Há mais ou menos uma semana eu os estou sentindo. Se comento alguma coisa, daqui a pouco outra pessoa que não tomou conhecimento toca no assunto, às vezes até mais de uma pessoa, ou acontece um encadeamento de assuntos relacionados àquele. Começou com o já falecido escritor e poeta Miguel Marvilla, do qual estive recordando que ele me vendeu um livro há muito tempo (uns trinta anos atrás), e eu relembrei um poema que gostei e único que me lembro: Não Houve uma Tarde em Manguinhos. Como a lembrança ficou meio teimosa em minha cabeça resolvi fazer um em homenagem ao autor, e escrevi “Delírios”. Não quis pesquisar e reler para não sofrer muita influência, e somente após terminar é que fui ler o dito cujo, e para minha surpresa era tão parecido que, em alguns aspectos, beirava o plágio. Outra surpresa é que o poema é de Gilson Soares, de quem nunca ouvi falar e, duvidando que fosse mesmo dele, continuei pesquisando e li um depoimento de Marvilla, onde ele fala em plágio e que se alguém for plagiar que o faça com Cem Anos de Solidão, de Garcia Márquez, pois em sua opinião, é o único que merece o pecado. À noite, vendo um filme ruim que nem me recordo o nome, um personagem fala que “depois do Gênesis, Cem Anos de Solidão é o único livro que toda a humanidade deveria ler”.
No outro dia fui à minha regular consulta com a psicóloga e começamos a falar sobre livros, escritas, e misturamos com os grupos de pessoas que ela acompanha, e para um destes ela me convidou para fazer uma oficina. Eu retruquei que não sei e que a única que assisti foi ministrada por quem? Marvilla! Ela me diz que ele frequentou o curso (de psicologia) junto com ela. Aí é demais, não?
No terceiro dia minha bela nega me aparece com o Cem Anos e a promessa de receber emprestados o último romance do Gabo, Memórias de Minhas Putas Tristes, e efetivamente o traz no dia seguinte. O livro é composto de pouco mais de 130 páginas e como eu não o lera, no mesmo dia li mais da metade delas. No preâmbulo é afirmado que a história é de um ancião de 90 anos e exatamente no dia em se torna nonagenário, ele solicita a uma conhecida cafetã que lhe consiga uma Lolita virgem para ele passar a noite. Parêntesis breve: na mais da metade que li do livro cheguei à primeira página em que ele desenvolve este tema. Parêntesis fechado, voltemos aos nossos pensamentos conectados. Pois bem, não voltei a ler o livro mas esta primeira página trata, diz aí de quê? Delírios! É, bebé, eu que não creio (peço a Deus por minha gente) fiquei até com medo. De duas coisas: do fato em si, de não ter fé, e dos finados que, segundo dizem, permitem ou transmitem seus pensamentos aos médiuns.
Consideremos que no meio da narrativa eu ainda comi mosca: no mesmo dia em que chegou o romance da ninfeta eu, comentando sobre escritores russos, e isto também por causa do que lera sobre o poeta tantas vezes já citado, me enganei e disse que não tinha lido Lolita. Bom, antes do fim do dia me apareceu uma para eu ler, de um Nobel colombiano, mas depois lembrei que tinha lido sim, só que tenho o péssimo hábito de não conservar os livros, porque sei que não terei paciência para reler. Estou pagando meu pecado relendo um bem robusto: Cem Anos de Solidão.
Para Gabi, Úrsula e Remédios, as belas.
Setembro de 2013.