sábado, 31 de agosto de 2013

VOOS DIVERSOS

Este eu pus em outra página mas como sei que muita gente não frequenta as duas, vou por aqui também.


Homens Voam, Pássaros Falam

O Campeonato Estadual de Xadrez, como de praxe, inicia-se por Vila Velha (ES), e colegas pedem para eu fazer um pequeno registro. Eles dizem que parece não haver nada interessante para se escrever, o que já ouvi outras vezes e, confesso, até pensei, em casos semelhantes, mas estes foram resolvidos a contento. Com a parca experiência adquirida no ramo, comecei a dividir minha atenção entre o tabuleiro e os aparentemente insignificantes acontecimentos ao redor, que entre outros destaco:
1 – A Imprensa: avisada pelo bom e abnegado trabalho da Edna, comparece, e lá estamos nós em duas redes de televisão. É claro que eles pensaram que o jogo era de futebol e só nos filmaram pra não perder a viagem. Será maldade minha achar que foi um erro induzido? Ò Senhora Imprensa, se algum dia um seu representante me ler, o que muito duvido, mas que me honraria, diga-lhe que é tudo irreverência e para ser presunçoso, irônico. Que volte outras vezes, mesmo que enganada(o), quem sabe, já que existe o campinho, a gente bate uma bola.
2 – Personagens: é sobejamente conhecida a gentileza de Namyr, e na entrega da premiação lá está ele nomeando os títulos de campeão de cada um. Quando chega minha vez de receber a medalha de décimo-último ele, não encontrando qualquer título pra me elogiar, me sapecou um “campeão das crônicas”. Bortoloso, outro que no convívio é a gentileza em pessoa, tanto que nos levou com excesso de lotação em seu carro, já no tabuleiro... Disse que não trocou as torres com o Edvaldo porque as dele, Bortoloso, eram ativas. Ah, tá, a vantagem era de apenas seis peões! E por último, como a vez é dos gentis, tá o Edvaldo, na mesma partida, justificando o não abandono: ora, eram tantos peões que seria fácil afogar o rei.
3 -- Partidas: além da citada anteriormente de mais duas apenas posso falar, pois, infelizmente, vi poucas, porque algumas das minhas demoraram bastante. Em uma o Mário Arnaldo deu um bonito nó tático/estratégico no Anderson e, com poucas peças no tabuleiro, deixou bispo e cavalo adversários algemados e vigiados por um carcereiro nanico, conhecido como piculito. En passant: lembremos que o mesmo Anderson acabara de bater o Namyr, (forte candidato ao bi) ajudado por forças intraterrestres, descritas no próximo item. Na outra partida ocorre o bizarro mate da covardia onde a cavalaria de dois exércitos e mais alguns próceres da Igreja cercaram impiedosamente um rei que nem roupa tinha. Certamente foi a vingança antecipada do velhinho que depois apareceu com o guri (simpático e persistente Fernando) na televisão sob o título: xadrez para todas as idades
4 – As cabeças de burro: aqui eu tive que usar uma habilidade especial e ainda fazer um pequeno vôo para conseguir a informação. É que a fonte, que me deu autorização escrita, quero dizer, cantada, para divulgar seu nome, foi um tagarela casal de bem-te-vis, e traduzir do idioma deles pro nosso não foi nada fácil, mas aí vai o que eles me contaram. Logo após o Walter ganhar o primeiro torneio local eles notaram uma proliferação de minhocas e outros pequenos insetos no campinho de futebol onde procuravam alimentação. Bica pra cá, cisca pra lá, descobriram que o adubo provinha de várias cabeças de burro enterradas e é por isso que ninguém até hoje conseguiu ganhar o torneio duas vezes. A exceção deveria ser o próprio Walter, mas os burros, como tais, não sacaram bem a estória. Vá-se entender cabeça de burro! Comentário do mandingueiro ao saber da inconfidência ornitológica: eu deveria ter cometido crime ambiental e enterrado cabeças de inteligentes golfinhos, ou quem sabe, até de bem-te-vis!
5 – O gol de placa: para não desapontar a televisão voltamos ao futebol e denominamos assim a bela parceria efetivada entre a Federação de Xadrez e a Associação de Moradores, para a realização de eventos e implantação de uma escolinha do esporte. (De xadrez, não futebol.) Com o ótimo espaço físico existente e o interesse demonstrado pelos parceiros, certamente teremos ali, em pouco tempo, o centro de excelência que o Estado tanto clama.

Texto psicografado, em boa parte, durante um breve(?) período de abdução.

Stenio, com a colaboração de um ET na tradução.
Março de 2007, calendário terreno.


quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Passarinho Raivoso

Acho que o urubuzinho ainda está puto comigo pois nada aqui quer funcionar. Dois computadores, o telefone, chuveiro elétrico e até eu, mas isso é coisa mais antiga.


Praga de Passarinho

Como sou muito bom no ramo de rogar praga, logo me vieram à mente vários títulos para este texto. Praga de Urubu, que no Ceará, minha terra, dizem que é muito forte, tanto que faz o de baixo cagar no de cima. Praga de madrinha que de acordo com Tom Jobim, não tem perdão, pega que nem chiclete em sola de sapato. Praga de turco, que certa vez fui vítima de uma, e como turco gosta de economizar em tudo, ele aproveitou e jogou logo em dois. Tive que utilizar meus santos fortes, e me livrei da bendita, e aí o outro alvo caiu sobre a minha mesa, quebrou esta e a bunda, foi parar no hospital. A mesa quebrada não satisfez o praguento e à noite minha parte ainda estava em vigor, aí um outro caiu no meu lugar indo parar no mesmo hospital. Praga de baiano, que normalmente vem acompanhado de uma boa mandinga, e aí quem se livra? Há algum tempo tivemos aqui na Caixa Federal do ES um gerente regional muito chato que desagradou a bastante gente. Juntamos eu e mais meia dúzia de bons de praga mas, o melhor que conseguimos foi mandá-lo para a Bahia. Eu fiquei a duvidar de meu poder pragatório mas, menos de um ano depois o disgramado ganhou uma de baiano. Resultado: perdeu a função e como prêmio foi atender no balcão de uma Agência onde o gerente era um inimigo seu. Acho que a minha, como a do turco, ainda estava em vigor.
Com tudo isso, por que prevaleceu então Praga de Passarinho? Ora, se eu pusesse o nome de Praga de Urubu, ele poderia alegar preconceito de cor, pois é meio escurinho; se fosse de madrinha eu estaria sendo injusto com estas que normalmente são boas e meu passarinho não o é; de turco, aí seria injusto com ele pois turco não dá nem bom dia de graça e ele me dá: faz muitos filhos, que eu vendo para os mercadores, como os turcos fizeram com José. Então só restava Praga de Baiano e quando ele chegou aqui era mesmo meio baiano pois só queria saber de cochilar, tanto que ganhou o nome de Professor, em homenagem a minha mulher, que ensinava na escola pública, acordava muito cedo e passava depois o dia dormindo. Mas ele passou de fase e hoje é bem esperto: pra fazer filho e rogar praga!
Passadas as preliminares, e como não vai ter meio de jogo, vamos aos finalmentes. Que praga braba foi que este moleque me arranjou? Depois de 13 (tinha que ser 13?) anos de briga de morte com a Caixa Econômica, eu finalmente venci um round, e recebi uns trocados. Rapidamente minha nega inventou que eu tinha que tirar passaporte, e nem vou dizer pra onde ela quer ir, pra não dar azar ou ganhar mais uma praga. Fomos então tirar o tal do passaporte e tinha que passar primeiro no computador. Passamos e ele, nem sempre tão inteligente, nos mandou para a sede da Polícia Federal em São Torquato, Vila Velha, na divisa com Vitória. Lá pegaríamos somente uma informação mas, os bem mais inteligentes humanos nos mandaram lá para o Shoping Vila Velha, que é no outro extremo. Eu já quis voltar dali, mas minha paciente mulher insistiu e lá fomos nós. Conseguimos a informação mas, mas, mas, eu teria que tirar uma nova identidade porque a minha é de 1969 (será que não vale porque foi emitida pela ditadura militar?). Aqui eu zuretei e falei que não ia mais pra lugar nenhum, que ela fosse com quem quisesse, mas ela não se deu por vencida e na calada do dia, convocou a Angelita, que com seu jeito manso e pidão sempre me convence de tudo. Fui eu junto com ela, Angelita, que logo inventou que também precisava de identidade. Eu já na minha quarta idade teria direito a atendimento prioritário mas nem quis, pois teria mesmo que esperar por ela; mal sabia eu que a praga do Professor já começava a fazer efeito. Angelita rapidamente foi atendida e eu seria o próximo, mas este próximo não estava nada próximo e lá estamos nós esperando um tempão. Ameacei novamente vir embora e Angelita foi reclamar. Resultado: meu nome não constava no computador e lá me fui pra fazer tudo de novo, e para completar minha raiva, assim que terminei, acharam a primeira ficha. Como já não tinha ninguém no posto fui direto tirar as digitais mas no curto espaço percorrido dei uma olhada no preenchimento e lá estava como minha mãe, minha ex-mulher, da qual me separei há quase vinte anos. Voltei para fazer a correção e a pessoa tinha saído, parece que teve uma dor de barriga, e nem vi se voltou. Uma outra pegou, corrigiu(?) e mandou eu sujar meus dedos. Fiz, mas rapidamente ela constatou outros erros e lá vou eu novamente na minha via sacra. O pequeno erro agora era que na minha certidão de casamento constava minha mãe como pai e a ex como mãe. E eu imaginando que o casamento gay fosse coisa recente!
Afinal, porque descobri que era praga do passarinho? Quando chegamos da primeira viagem, onde não aceitaram minha identidade, ele me irritou com alguma coisa e eu o chamei de “carteira de identidade falsa”, e na viagem seguinte, as minhas três ou quatro é que eram falsas. E com efeito retroativo, pois até a certidão de casamento, feita há mais de trinta anos, também estava ruim. Tô achando que, pelo alcance, podia ter chamado esta de praga de urubu, e daquelas que pegam em cristão!
Agosto de 2013.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

A LUTA PELO PÃO

Este texto teve que ser submetido à censura porque envolve meus outros irmãos. Foi aprovado com a ressalva de que o menino teve uma pequena ajuda pra comer as cem bananas, de outro irmão, Ernandi. Eu já imaginava pois os dois só andavam juntos, então um não ia deixar o outro com fome. Pus tudo na conta do Piunga porque além de ser muito pequeno era também barrigudinho, cearense típico, pelo menos da época.


Sofridas Refeições

Vez ou outra se vê em filmes as pessoas fazendo orações em agradecimento pelas refeições e eu costumo relembrar algumas das minhas, que até tiveram reza sim, e como os caminhos de Deus são misteriosos, pode ser que as preces tenham sido atendidas, mesmo que não as minhas. E também como dizem que Ele escreve certo por linhas tortas, então deve estar escrevendo muito pra mim, porque quase todas minhas linhas são tortas e até meu corpo.
Nas refeições, eu rezava sim, mas era pra reza acabar logo e eu poder saciar um pouco da minha fome. Nem sempre eu tinha sorte porque a refeição me era dada por um tio carola e ele rezava um terço todo e até mais de um, se a ocasião fosse especial.
A missa dominical era bem cedo e minha mãe me obrigava a ir, então eu saía em jejum (embora esse lance de jejum fosse algo meio corriqueiro pra mim), e certa vez desmaiei dentro da igreja. Como não lembro de ter caído, devo ter sido amparado pela multidão que me cercava. Deram-me água e um cafezinho e rapidamente me reanimei, mas ficou a vontade de cair outras vezes, creio que só não o fiz porque sempre fui muito ruim para representar qualquer papel que não seja eu mesmo.
Dos seis aos dez anos morei com parentes no semiárido, e sendo eles muito pobres, quase ou sempre só se tinha como alimento o feijão de corda, velho e todo furado, buracos estes que serviam de residência pro tempero: gorgulho. Lembro que uma vez eu bebi um caldo com óleo e achei delicioso. Pedi mais já que o caldo era mais farto, mas aí veio sem o óleo. Me lasquei! A emenda saiu pior que o soneto.
Eu era muito irritável e embora não costumasse provocar brigas, também não me provocassem, pois eu não era muito bom em evitá-las, e assim eu tinha uns fregueses, de bater ou de apanhar. Um destes era meu primo Flávio, que depois, não sei por que, virou Flávio Cachaça. Alguém ofereceu umas bananas, não muitas, para quem ganhasse uma briga entre mim e ele, e aí meu, com uma premiação dessas, não deu outra, ganhei de lavagem.
Um outro primo muito gente boa e considerado bom de briga, um dia me irritou com um motivo fútil qualquer, então não deu outra: tasquei-lhe uns socos e fiquei uma semana sem jantar, pois ele era filho do meu tio carola, lá do início, que me fornecia a alimentação. Não existe mesmo jantar grátis.
Meu irmão caçula era bem pequeno, tão que recebeu o apelido de piunga que é o piolho habitante do saco do mucuim (também piolho). Um dia alguém achando que ia se divertir ofereceu a ele um cento de bananas, mas ele tinha que comer todas, e ali mesmo, na frente da turma. Ora, se isso é nada, o menino comeu rapidinho e se tivessem oferecido mais uma duziazinha ele agradeceria.
Já em um outro tempo, vim para o Espírito Santo como empregado da Caixa Econômica Federal, exportado juntamente com uns dez colegas. Poucos meses depois foi o aniversário do Gerente Regional e os puxa-sacos organizaram um jantar em um dos melhores restaurantes de Vitória. Foi comida saindo pelo ladrão e da melhor qualidade. Eu com pena de perder tão bons alimentos, dei o maior vexame e comi um absurdo, matando de vergonha os conterrâneos. Na verdade eu só parei quando o garçom furtivamente tirou o meu prato.
Hoje, já quase civilizado, vez ou outra compro um filé mignon ou um salmão e digo que é pra me vingar dos tempos mais difíceis, sendo que este último, de quebra, me forneceria um pouco de antioxidante ômega 3. Ora, logo me veio a notícia que este peixe é importado de fazendas de criação do Chile e cheio de produtos químicos, que faz muito mais mal do que bem. Alegria de pobre realmente dura pouco, mas eu planejo também me vingar disso e vou subir a Cordilheira dos Andes, vou lá em uma dessas fazendas e comer salmão igual eu fiz no restaurante: até me roubarem o prato. Talvez eu não leve nem minha linda nega, senão ela efetua o roubo muito antes do que seria permitido por lei.
Agosto de 2013.