segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

PÉROLA RARA

Pérola Rara

Nas profundezas abissais de um oceano mental (ou virtual) perdi uma pérola. Suas feridas, herdadas da mãe-ostra, mal cicatrizadas ou de todo não, eram por demais doídas e não suportaram o atrito contínuo com a dura realidade. Ela fugiu. Ela que já vivia em fuga, mimetizada em areias cinzentas, escondendo-se até de si mesma e o quase sempre iludido poeta cometeu mais um de seus monumentais erros: quis trazê-la à luz. Com gestos inábeis, atabalhoados movimentos em busca da vida, sem nem mesmo a paciência necessária à descompressão. E aí o que encontrou foi a morte quando sua adorada e encantadora pérola adentrou a um buraco negro, onde é possível esconder a soma de todos os corpos físicos, ou nada, pois de lá nada volta. Sem ar, sem luz, sem razão, ele espera e reza, mesmo sem ter fé.
Ela sumiu no Triângulo das Bermudas, que é o buraco negro marítimo, e não deixou qualquer rastro. Nem a brisa do mar, que já não é tão suave, dá notícias dela.
Alguns poetas, quando tristes produzem obras primas, outros secam por dentro, morrem. Mas dizem que ninguém morre de tristeza. Acredito que quem pensa assim não conhece o âmago de alguns poetas, ou mesmo de outras pessoas, bem sensíveis, mas não poetas.
Morre-se sim, de tristeza. Ou ficar seco por dentro, para quem tem por hábito, criar, escrever, poetar, não é morrer?
O vazio também é abissal, e não encontra na matéria algo que possa preenchê-lo. A espera do milagre pode durar a vida, mas o que lhe resta que não seja rezar? Louvada ela foi à exaustão mas a poesia não deve ser das melhores, pois não teve a força de conservá-la ou trazê-la de volta quando debilmente lhe suplicou através de uns poucos e quebrados versos.
Ele fica a pensar se ela estará mesmo nas profundezas do mar, ou se de forma consciente ou não procurou o suicídio nas areias escaldantes dos desertos, ou ainda se não está volateando, ao sabor do vento, louca completa que perdeu o rumo, não sabe mais quem é ou onde mora. Mas provavelmente esta última é mais opção dele que dela.
Pode ser também que ela tenha usado de magia, pois sem dúvida tinha a beleza e os poderes de fada, e após tornar-se minúscula, escondeu-se em uma célula qualquer do músculo da vida, daí este incômodo no peito do escritor, que arranha, perturba, distorce sua vida e que alguém mais sábio já batizou de ... saudade.

Stenio, maio de 2009.

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